No último sábado (26/10) a União dos Povos do Vale do Javari (UNIVAJA) encerrou a sua participação na Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade 2024 (COP 16) recebendo o Prêmio Equatorial.
A premiação, oferecida pelo Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PNUD), foi um reconhecimento ao trabalho realizado pela UNIVAJA por meio de sua Equipe de Vigilância (EVU). A EVU foi agraciada juntamente com outras onze iniciativas indígenas e de comunidades locais de várias partes do mundo sob o tema “Natureza para Ação Climática”. Além da instituição brasileira, foram premiadas iniciativas de Bangladesh, Colômbia, Irã, Quênia, Marrocos, Senegal e Zâmbia, que se destacaram entre mais de 600 inscritos, de 102 países.
Ao longo da semana, a comitiva formada pelo coordenador da UNIVAJA Bushe Matis, Beto Marubo, Manoel Chorimpa e Bene Mayuruna participou de diversas atividades em Cali, na Colômbia, incluindo mesas de debate e reuniões com organizações internacionais para discutir as questões relativas aos povos indígenas em isolamento e seu importante papel na proteção da biodiversidade.
Para Bushe Matis, coordenador da UNIVAJA, a presença da comitiva no evento foi muito importante porque “hoje se fala muito em biodiversidade e mudanças climáticas, mas é cada dia mais claro que cuidar dos indígenas isolados é uma questão central para manter as florestas em pé e preservar a biodiversidade, ajudando a salvar o planeta”, diz.
Bushe Matis considera que o prêmio fortalece a luta da UNIVAJA em favor da proteção territorial e da floresta.
“Esse prêmio reconhece os esforços incansáveis de nossas diversas comunidades que se uniram para defender seus direitos constitucionais, preservar nosso conhecimento tradicional e proteger o vasto Vale do Javari — um território que continuaremos sempre a preservar, salvaguardando nossas florestas intactas e culturas vibrantes para as próximas gerações”, afirma o líder indígena.
Criada em 2021, diante do desmonte da política indigenista no Brasil, a EVU é formada por equipes indígenas que realizam a vigilância e monitoramento de seu território, a Terra Indígena Vale do Javari, a segunda maior Terra Indigena do país. As equipes são formadas por diferentes povos que habitam o Javari e se organizam por calhas de rios, que são subdivisões das bacias hidrográficas compostas por um rio principal e seus afluentes, devido à extensão do território.
O reconhecimento do trabalho da EVU é também uma homenagem ao legado de Bruno Pereira, instrutor convidado para treinar os indígenas nesse trabalho de monitoramento devido a seu reconhecido trabalho na Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), junto a Orlando Possuelo, que segue à frente das atividades da EVU. Bruno foi morto quando estava em viagem no âmbito de seu trabalho com a equipe.
Durante o evento, a UNIVAJA participou também de reuniões sobre o corredor territorial Yavari-Tapiche. Idealizado pela Fundação Rain Forest da Noruega, esse corredor envolve uma série de territórios contínuos e interrelacionados, se constituindo na maior extensão de florestas do mundo habitada por esses povos com pouco ou nenhum contato com a sociedade e envolve, também, povos indígenas da Colômbia e do Peru.
“Estivemos lá para enfatizar a importância desse corredor, que envolve parentes de outros países e é de extrema importância para que possamos atenuar esta avassaladora forma de destruição do meio ambiente que ocorre hoje”, afirma Beto Marubo.
Ao participar da COP 16, a UNIVAJA também se une à carta divulgada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, lançada ao final do evento.
A RESPOSTA SOMOS NÓS
Nós, povos indígenas brasileiros, diante da gravidade das crises de biodiversidade e do clima, sabemos que não há tempo a perder.
Aqui, na COP 16 em Cali na Colômbia, viemos declarar que não aceitaremos mais nenhum projeto predatório, que ameace nossas vidas, nossos territórios e a humanidade. Não aceitaremos mais nenhum projeto de petróleo e gás e qualquer outra forma de exploração predatória na Amazônia brasileira, em nossos territórios e nossos ecossistemas. Não haverá preservação da biodiversidade e nem territórios indígenas seguros em um planeta em chamas.
Nós sabemos quem está botando fogo no mundo e o impacto violento que isso tem produzido nos nossos territórios: seca severa, isolamento forçado, doenças, falta de alimento, invasões, conflitos e mortes.
Diante do colapso iminente da sustentação da vida no planeta, ações fortes e efetivas precisam ser tomadas. Enquanto os governos continuam querendo mediar metas insuficientes e financiamentos vazios, queremos anunciar que, a partir de agora, só haverá paz com a Natureza se declararmos abertamente a guerra contra os combustíveis fósseis e qualquer outro projeto predatório que ameaça a vida no planeta.
O governo colombiano já deu o primeiro passo, suspendendo a concessão de novas explorações de petróleo e gás no país e já nos reconheceu como autoridades ambientais. Esperamos que outros países sigam esse mesmo compromisso. A outra face da crise climática e da biodiversidade é a crise de liderança e de valores. Nós nunca abdicamos desse lugar e não vamos nos perder em discussões vazias e compromissos estéreis.
Demandamos a retomada imediata das demarcações de todas as terras indígenas no Brasil como uma política climática efetiva e o financiamento direto para a proteção integral dos nossos territórios e nossos modos de vida em harmonia com a Natureza.
A COP 30 será no nosso território. Não aceitaremos que as discussões aconteçam sem a devida consulta e participação das nossas vozes e autoridades. Reivindicamos a co-presidência da COP de Clima no Brasil para que o acúmulo de nossos conhecimentos e experiências ancestrais possam oferecer ao mundo a oportunidade de um outro futuro.
Convocamos todos os povos indígenas, parceiros, aliados e todos que se importam com a vida na Terra a se juntarem ao nosso chamado para, coletivamente, segurar o céu. Se depender de nós, o céu não irá desabar.
SEMPRE ESTIVEMOS AQUI.
O levante do céu começa agora.
A RESPOSTA SOMOS NÓS
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB)
Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB)
Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME)
Conselho do Povo Terena
Grande Assembléia do povo Guarani (ATY GUASU)
Comissão Guarani Yvyrupa (CGY)
Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (ARPINSUDESTE)
Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (ARPINSULl)
União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (UNIVAJA)